03 junho 2008

Crônica 10: Paulicéia Mon Amour!

Sinif...Snif... Acthin... Atchin... Funga, espirra, espirra e funga. Inverno na Vila de Piratininga de São Paulo, para um nariz carioca a corisa é o presente atmosférico da metrópole jesuítica. Agruras a parte, é preciso se misturar a multidão, conter o chiado do “s”, disfarçar-se dos olhares curiosos e passar desapercebido; coisa que não é difícil aqui, pois esta cidade abriga os tipos mais facetados, diversos numa unidade laboriosa e febril! Busco um itinerário no metrô, estação da luz, luz à palavra , luz do museu da palavra. Chegando a prestigiosa estação construída em estilo inglês, logo de saída me deparo com a Pinacoteca de São Paulo e o Parque da luz, mas esta é outra aventura cultural, agora estou sedento pelo verbo lusitano que se transmuta em museu vivo da palavra! Na bilheteria a primeira constatação capitalista, cultura não é de graça, e custa caro, muitas pessoas deixariam de pagar a entrada para tomar mais um chope ou pagar um cachorro quente; mas estou sedento de viver celebral, de mais a mais, menos um chope vai fazer bem a minha silhueta. Na reformada estação da luz o museu ocupa um espaço magistral, combina espaço sóbrios com luz baixa e agradável aos olhos. Vamos direto para o terceiro andar, assistir a uma projeção sobre o desenvolvimento da língua através dos tempos. Uma narração soberba de Fernanda Montenegro, e em menos de dez minutos vamos do Neolítico ao Rap (Rithimy & Poetry) de rua, quando menos se espera, somos convidados a passar a praça da palavra, onde a poesia luso-brasileira trafega no chão e nas paredes da sala em projeções; as vozes em declamação de artistas e mestres da poesia nos acalentam os ouvidos num espetáculo sinestésico. Sai de lá com um punhado de poemas e belas palavras, como se fossem bolinhas de gude com as quais iria brincar! Passamos ao segundo andar, onde painéis eletrônicos interativos contavam, qual escritores de cordel a aventura popular brasileira através da palavra morta e viva. Um painel gigante na lateral atravessava a sala com a velha linha do tempo da língua e da palavra, pois as pessoas até hoje pensam linearrmente, mas a palavra da voltas e reviravoltas, reinventando tempo, cultura, cotidiano e espaço. Talvez os velhos indianos tenham mais noção disso do que nós. No primeiro andar uma homenagem a uma velha artífice da palavra, Clarice Linspector, com sua elegância e rebeldia, figurava em imagem e grafia estampada nas paredes sedentas de emoções. Trafegava embriagado pela sala das gavetas, gavetas do chão ao teto, onde se depositaram pequenos relicários do viver da escritora, objetos de seu cotidiano, que traziam ainda o vigor e a energia de sua palavra! Após essa banho de descarrego cultural, que lava a alma embrutecida pela rotina, a necessidade básica da vida nos acometia, fome! Nos dirigimos ao Bexiga, atrás da memória e do paladar da Itália. Bem... Alcançamos a rua 13 De Maio, subindo seu breve aclive, atrás de uma bela tratoria para saciar nosso desejo de uma Nápoles da garoa.
No “Cilas” encontramos o sortimento e quantidade necessária a nossa avidez gastronômica, apesar de ser um rodízio de pizzas a qualidade e o sabor eram magníficos! Refastelados procuramos o destino cotidiano de quase todo paulista, o metro. Sonolentos e empanzinados pegamos a conexão com os trens urbanos, direção Peruz, pois nosso refugio metropolitano nessa aventura era a periferia. O trem e seu vagar embalava a sonolência do final de noite, na ultima composição se misturavam os últimos trabalhadores, nós turistas do saber e alguns seres inclassificáveis da metrópole. Nas denominações das cercanias do centros urbanos brasileiros, subúrbio e periferia parecem ser diferentes, eu carioca de nascimento e opção estranhei um pouco o soturno e triste vagar das pessoas da periferia paulista indo para casa. Meio que resignadas com seus destinos mecânicos na labuta, diferente do subúrbio do Rio, onde o cansaço é sublimado com um bom copo de cerveja e um papo com o vizinho antes do recolhimento.
Desta aventura na “Paulicéia” levo o encantamento da cultura, e o pesar da distância entre os viventes dessa cidade.

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